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Por Dr. Ricardo Afonso Teixeira*
A Universidade da California em Los Angeles liderou um estudo publicado recentemente na Scientific Reports que mostrou que os seres humanos cooperam entre si na maior parte das vezes que são requisitados. Mais de 40 horas de análise de vídeos da rotina de mais de 350 pessoas espalhadas em cidades de diferentes países da Europa e vilas rurais em quatro continentes demonstraram que o apoio em tarefas do cotidiano acontece em 80% das vezes em que há simples solicitação de ajuda, mesmo não verbal. Um exemplo é o de passar um talher para o outro durante uma refeição quando alguém lhe aponta o objeto.
Foram mais de mil oportunidades de colaboração nessas 40 horas de vídeo. Dez por cento ignoram o pedido de ajuda e outros 10% negam, mas justificam a razão de não poderem colaborar naquele momento. Não houve diferenças significativas entre as diferentes culturas estudadas, e mais, a cooperação foi semelhante entre parentes e não parentes. O método utilizado para analisar o nível de cooperação através de atitudes pequenas do dia a dia traz um resultado diferente de outros estudos com tarefas de maior custo para o indivíduo. Nessas situações de maior demanda, há mais influência de fatores culturais e do fenômeno de reputação.
Esses resultados sugerem que nossa tendência a ajudar o outro é mais inata do que cultural. É sabido que crianças, até com menos de dois anos de idade, já são capazes de colaborar com outras na realização de tarefas motoras, fenômeno chamado de altruísmo instrumental, e essa é uma condição também observada entre nossos ancestrais chimpanzés. Porém, dar uma forcinha para abrir uma porta é uma coisa, já dividir o alimento é outra bem diferente. Crianças com 7 a 8 anos de idade já dividem seu alimento de forma igualitária com parceiros do mesmo grupo social (coleguinhas de escola), mesmo quando têm a chance de ficar com a maior parte e ainda apresentam aversão a situações em que a divisão é feita com desigualdade.
*Dr. Ricardo Afonso Teixeira é doutor em neurologia pela Unicamp e diretor do Instituto do Cérebro de Brasília

Por Ricardo Afonso Teixeira*
Os gregos já falavam do amor pelo semelhante e cunharam o termo homofilia. A homofilia realmente é um fenômeno inequívoco, mas há um crescente corpo de pesquisas mostrando que há também a acrofilia – amor pelos extremos. As pessoas tendem a dar mais atenção àqueles que pensam de forma similar, homofilia, mas também têm mais atração por opiniões extremas, mesmo que sejam diferentes das delas próprias. As pessoas com opiniões extremas podem ser vistas pelo outro como mais engajadas, talvez mais interessantes. Os estudos têm mostrado, como já era esperado, que a combinação de homofilia e acrofilia política alimenta a segregação tornando mais difícil a cooperação, dimensão essencial para uma sociedade saudável.
A acrofilia tem sido estudada entre pessoas que nem se conhecem, situação muito distante de uma relação próxima, como a de um casal. Numa relação a dois temos um corpo muito robusto de evidências de que os opostos não se atraem. Aqui a homofilia tem que existir para que a relação tenha maior chance de durar.
A tal história que os opostos se atraem realmente é um mito. As pessoas costumam se casar com outras com nível educacional / socioeconômico parecido, com crenças religiosas e políticas semelhantes e que têm mais interesses em comum. E a bagagem que carregamos no nosso código genético influencia também a escolha do nosso parceiro. Pesquisas mostram que uma pessoa tem o código genético mais parecido com o do seu parceiro ou parceira quando comparado ao DNA de outras pessoas com mesmo nível socioeconômico, etnia e origem de nascimento.
Pessoas com mais semelhanças que diferenças têm mais chance de se atrair para construírem uma relação de longo prazo. Entretanto, vale sempre a pena lembrar que respeitar e incentivar as diferenças pode ser uma das melhores receitas para que essa relação se sustente.
*Ricardo Afonso Teixeira é doutor em neurologia pela Unicamp e diretor do Instituto do Cérebro de Brasília

Por Dr. Ricardo Afonso Teixeira
Alimentos com altos teores de carboidratos e gorduras têm grande poder de estimular nossos centros cerebrais relacionados ao prazer e à sensação de nos sentirmos recompensados, promovendo a liberação de neurotransmissores como a dopamina, serotonina e a endorfina. Sabemos que a ativação desses centros de recompensa cerebral está fortemente associada à sensação de bem-estar e já foi demonstrado que até o simples contato na boca de uma solução de carboidratos, sem sua ingesta, é capaz de ativar esse sistema cerebral.
A interpretação para esse fenômeno é a de que nosso cérebro é programado desde os tempos ancestrais a ter prazer em consumir alimentos calóricos e com isso ter maior vantagem evolutiva. Baseado nessa teoria, a preferência por alimentos calóricos seria inata sim, mas ao consumirmos alimentos calóricos, o cérebro muda suas conexões em curtíssimo prazo, como se fosse treinado a repetir a ação em um futuro próximo. Isso foi o que pesquisadores do Instituto Max Planck na Alemanha e da Universidade de Yale acabaram de demonstrar em estudo publicado pela respeitadíssima revista Cell Metabolism.
Voluntários comeram diariamente um pudim com uma dose extra de gordura, por um período de oito dias, e passaram a apresentar uma ativação do sistema dopaminérgico de recompensa numa intensidade bem maior do que aqueles que comeram o pudim com menos gordura. Essa maior ativação não se desfaz do dia para a noite, o que nos faz pensar que cada alimento hipercalórico que ingerimos faz com que o cérebro, dias ou semanas depois, ainda esteja bem treinado a sentir o prazer novamente. E mais: outros estudos já mostraram que, após semanas comendo alimentos supercalóricos, o cérebro não se ativa como antes a alimentos pouco calóricos.
Em tempos que não mais caçamos ou coletamos, tempos de geladeira e supermercado, esse “treinamento” do sistema de recompensa dopaminérgico é um motor potente que contribui sobremaneira para a espiral de obesidade que vivemos hoje.
*Ricardo Afonso Teixeira é doutor em neurologia pela Unicamp e diretor do Instituto do Cérebro de Brasília

Ricardo Afonso Teixeira*
O arroz está salgado mesmo que a foto não mostre isso.
Muitas pessoas procuram um serviço de saúde com sintomas neurológicos como fraqueza de um lado do corpo e os exames clínico, de neuroimagem, entre outros, não evidenciam uma doença neurológica que responda por esse sintoma. Histeria, síndrome conversiva, crise psicogênica, pseudocrise, são outros termos para descrever esse fenômeno e hoje não devem ser vistos como a denominações preferenciais, pois alimentam o estigma, preconceito e desinformação.
Histeria traz a origem grega do termo histero, de útero, sendo que a condição afeta em 70% dos casos as mulheres, mas não só as mulheres. Para a “elite masculina” o termo neurastenia já foi muito usado, sugerindo sintomas como reflexo do excesso de trabalho e ambição. O termo conversivo alimenta a ideia de que existe um trauma na história do paciente que se converte em sintomas neurológicos. Isso vem de longe, ainda com Freud e seus antecessores. O trauma nem sempre existe, mas eles estavam certos. História de negligência na infância e abuso físico e sexual são oito vezes mais frequentes entre indivíduos com transtorno de sintomas funcionais neurológicos (TSNF) e duas vezes mais comuns quando comparados a outros transtornos psiquiátricos. Isso tudo acontece mais nas classes econômicas menos favorecidas, e aqui a mulher está em desvantagem. Vale também lembrar que a América Latina tem o maior índice de violência contra as mulheres em todo o mundo (Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas).
Pseudocrise é um termo que leva o quadro do paciente ao descrédito e desconfiança e psicogênico alimenta a cisão entre a mente e o corpo. Aqui vale uma correção ao que foi dito no início: “quando não evidenciam uma doença neurológica que responda por esse sintoma”. Hoje o TSNF é visto como uma doença neurológica sim, doença psiquiátrica sim, e pra romper essa separação mente e corpo, vamos ao termo doença neuropsiquiátrica, então. Essa condição neuropsiquiátrica é considerada a segunda razão pela procura por atendimento numa cínica neurológica.
A mesma fraqueza de um lado do corpo que descrevemos é muito mais respeitada pelos profissionais de saúde quando é decorrente de uma doença neurológica bem conhecida e reconhecida, como por exemplo um tumor cerebral. O TSNF ainda é frequentemente designado pelos profissionais de saúde como piti, às vezes de simulação, fingimento, que são coisas bem diferentes. Isso traz muito sofrimento ao paciente. O cérebro desses pacientes com TSNF apresentam alterações em neuroimagem funcional como PET Scan e até em avaliações morfológicas na ressonância magnética. Não só as conexões cerebrais, o software, está alterado, mas o hardware também está. Imaginem Sigmund Freud tendo contato hoje com essas evidências! Pois é. Ele nos apresentou um outro lado do cérebro, ainda no século XIX, mas a ficha ainda não caiu. O TSNF não é consciente!
Portanto, dizer a um paciente com TSNF que os sintomas são coisas da cabeça dele ou dela refletem ignorância e falta de sensibilidade. A abordagem empática influencia na aceitação do diagnóstico e aderência ao tratamento que inclui psicoterapia, e em casos selecionados, medicações. Os resultados, na maior parte dos pacientes, são ótimos.
* Ricardo Afonso Teixeira é doutor em neurologia pela Unicamp e diretor do Instituto do Cérebro de Brasília

Por Ricardo Teixeira*
Na última semana, uma paciente, acompanhada por mim para tratamento de enxaqueca crônica, pediu-me um relatório para o seu trabalho recomendando que se possível fosse oferecida a ela espaço de trabalho menos ruidoso e com iluminação branca menos intensa para o melhor controle de sua condição clínica. As pessoas que sofrem de enxaqueca sofrem com a luz, ruídos e odores, não só quando estão tendo uma crise de cefaleia, mas é comum serem hipersensíveis a estímulos sensoriais intensos também entre as crises. Esse é o meu caso, dessa paciente, e é claro, fiz o relatório.
Nesses três anos de pandemia a discussão sobre o espaço físico do trabalho ressurgiu com tudo. Já na década de 1960 a companhia química DuPont inovou com espaços únicos para inúmeros colaboradores com a promessa de maior colaboração entre eles. Inúmeros estudos mostraram que as pessoas, na verdade, colaboram menos nesse modelo e frequentemente se queixam de ruído e distração. Além disso, o modelo de grandes espaços alimenta o sexismo e a hierarquia corporativa, onde as mulheres se sentem mais oprimidas em serem julgadas pela vestimenta enquanto aqueles com níveis mais altos na hierarquia solidificam suas posições também por se vestirem de forma mais sofisticada.
A saúde também entra nessa equação de custo e benefício dos grandes espaços compartilhados. Nesse quesito, a pandemia de COVID-19 mostrou que a maioria das pessoas pode trabalhar em casa com a mesma qualidade ou até melhor que no local de trabalho tradicional. Desde a década de 1990 sabemos que dividir o espaço de trabalho aumenta em um terço as chances de múltiplas infecções virais no ano.
Hoje pensa-se que o melhor é oferecer a possibilidade de espaços customizados de acordo com o tipo de trabalho e preferências do colaborador, respeitando a neurodiversidade. Uma pesquisa conduzida em 2021 nos Estados Unidos (Gensler Research Institute) mostrou que um terço das pessoas gostariam de trabalhar em casa integralmente e metade preferem um esquema híbrido, idealmente com dois dias na semana no escritório. Lembremos também do maestro dessas decisões pelo lado do empregador: o dinheiro. O trabalho em casa ou em um escritório virtual, que pode ser um Café, permite redução de custos, maior satisfação e menor rotatividade por parte dos colaboradores.
*Ricardo Teixeira é doutor em neurologia pela Unicamp e diretor do Instituto do Cérebro de Brasília

Por Ricardo Teixeira
Enxaqueca é uma condição clínica muito prevalente chegando a acometer uma em cada cinco mulheres. Por outro lado, cefaleia em salvas é mais rara e acomete preferencialmente os homens. As crises de dor de cabeça dessas duas condições clínicas dividem inúmeros aspectos em comum e, entre eles, está a tendência em ocorrer em determinados períodos do dia e segue um padrão de intervalo entre as crises de 24 horas..
Uma análise publicada esta semana na Neurology, periódico da Academia Americana de Neurologia, mostrou que a influência do relógio biológico ocorre em 71% e 50% dos pacientes com cefaleia em salvas e enxaqueca respectivamente, reforçando a influência do hipotálamo nesses casos. Hipotálamo é uma estrutura cerebral que controla o relógio biológico e tantas outras funções primárias como sono, fome e sede.
No caso da cefaleia em salvas, as crises costumam ocorrer do fim da noite até o amanhecer. É comum o paciente acordar com a dor, algo que também acontece muito na enxaqueca. Crises de salvas ocorrem mais na primavera e outono especialmente nos países com as estações bem delimitadas. Pacientes com salvas apresentam níveis maiores do hormônio cortisol e menores da melatonina.
Na enxaqueca as crises acontecem com ampla distribuição no curso do dia e são menos comuns no período da noite. Os níveis de melatonina também são reduzidos. Apesar de ainda termos um número limitado de estudos, uma das terapêuticas empregadas para a profilaxia de crises de enxaqueca e salvas é a melatonina. Os resultados até o momento são promissores.
*Ricardo Teixeira é doutor em neurologia pela Unicamp e diretor do Instituto do Cérebro de Brasília.

Por Ricardo Teixeira*
COVID longa, que podemos também chamar de sequela pós-infecção aguda por COVID-19, já tem mais de 200 sintomas registrados, mas aqueles associados à disfunção do sistema nervoso estão entre os mais prevalentes e incapacitantes. Na maioria das vezes os sintomas ocorrem mesmo após um quadro agudo de COVID-19 leve, devem durar pelo menos três meses após a infecção e podem persistir por anos. Estima-se que 10-40% dos infectados podem desenvolver COVID longa.
Sintomas comuns incluem fadiga, dificuldade de memória e concentração, hipersensibilidade à luz e ruídos, ansiedade, depressão e alterações do sistema nervoso autônomo que podem levar a tontura, taquicardia, desmaios, instabilidade da pressão arterial e distúrbios do ritmo intestinal.
Não é o ataque direto do vírus que provoca essa miríade de sintomas, mas provavelmente uma resposta imunológica desregulada e inflamação sejam os principais fatores. Partículas do vírus são mais encontradas no cérebro das pessoas que têm essas manifestações crônicas. Alterações nos pequenos vasos sanguíneos do cérebro parecem colaborar também e, junto aos neurônios e astrócitos, todos são vitimados pelo processo inflamatório.
A vacinação é imperativa para a redução dos perigos de uma infecção aguda grave, mas estima-se que só reduz a chance de desenvolvimento da COVID longa em 15%. Portanto o melhor negócio é não se infectar e para isso o uso de máscaras em ambientes fechados ainda é um grande aliado. Continuo recebendo frequentemente no consultório pacientes que se infectaram pela terceira ou quarta vez, sendo que a última há menos de três meses.
E então? Melhor é continuar se prevenindo, concorda?
*Ricardo Teixeira é doutor em neurologia pela Unicamp e diretor do Instituto do Cérebro de Brasília
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Há décadas nos deparamos com notícias de que há um efeito protetor contra crises epiléticas quando se ouve a música do gênio, especificamente a Sonata KV448 em Ré Maior. Será que isso tem algum fundamento? Pesquisadores da Universidade de Viena, país em que Mozart nasceu, acabam de publicar uma análise de todos os relatos científicos sobre o tema, mostrando que não há evidência confiável de que o fenômeno realmente exista na epilepsia ou em qualquer outra condição clínica. O estudo foi publicado pela Scientific Reports do grupo Nature.
Especula-se que a sonata de Mozart tenha efeitos positivos não só para a espécie humana, mas também para animais e até microorganismos. Poderia promover a inteligência de humanos adultos, crianças e até fetos. Fala-se nas vacas que têm maior produção de leite e bactérias que tratam melhor o esgoto quando em ambiente com a Sonata KV448. A origem dessas ideias começou após a observação na década de 1990 de que estudantes quando ouviam o primeiro movimento da sonata apresentavam um incremento cognitivo transitório na inteligência espacial, fato não comprovado por estudos posteriores. Uma indústria de produtos de músicas clássicas para o cérebro surge.
Todas essas promessas não têm sido confirmadas pela boa ciência, ou seja, através de metodologia robusta que permita chegar a conclusões de real associação entre uma coisa e outra. Mas uma coisa é certa: para muitos a música de Wolfgang Amadeus é um bálsamo para a alma que poderia trazer benefícios em algumas doenças. O atual estudo sugere que isso ainda não pôde ser comprovado com segurança.

A Academia Americana de Neurologia publicou recentemente em seu periódico Neurology evidências de que pressão alta na gravidez reduz o desempenho cognitivo décadas mais tarde. O efeito é ainda maior quando o quadro é de pré-eclâmpsia, condição em que os rins e outros órgãos são envolvidos. Esse efeito também foi maior nas grávidas que apresentam eclampsia que é quando a hipertensão arterial vem acompanhada de uma ou mais crises epilépticas, podendo evoluir até para um estado de coma.
Já sabemos que a pressão alta na gravidez é considerada um fator de risco para doença isquêmica do coração e acidente vascular cerebral e tem sido demonstrada uma associação com quadro demencial no futuro, apesar de resultados conflitantes. A disfunção cerebrovascular é um elemento chave para explicar a relação entre pressão alta na gravidez e demência, mas não devemos pensar apenas na demência vascular, quando lesões vasculares causam o déficit cognitivo, mas também na Doença de Alzheimer.
Os achados do atual estudo, com número robusto de pacientes envolvidos, confirmam a ligação entre pressão alta na gravidez e déficit cognitivo futuro, chamando a atenção para o rigoroso controle da pressão nesse período, ou melhor, em qualquer período.

Por Ricardo Teixeira*
Ó! Assim se pronuncia a palavra awe da língua inglesa que significa deslumbramento, admiração, reverência, mas ao mesmo tempo temor. Atingir o topo de uma montanha ao pôr do sol ou remar assistindo à aurora parecem ser mais interessantes do que fazer o mesmo no sol do meio dia, concorda? Uma pesquisa publicada recentemente no Journal of Environmental Psychology confirmaessa tendência que pode até ser encarada como uma obviedade. O começo e o fim do dia são mais belos, os fotógrafos não vão discordar, mas os extremos do dia são também mais associados à experiência mental de awe, fato confirmado pela pesquisa. A natureza, qualquer que seja o momento do dia, já é capaz de proporcionar benefícios mentais e cognitivos, mas pesquisas demonstram que com a vivência do awe os efeitos são ainda maiores.
Awe não é um sentimento que é incitado por qualquer estímulo. Qualquer fenômeno mais raro ou surpreendente na natureza tem mais chance de promovê-lo que o sol do meio dia. Estamos falando de um arco íris numa cachoeira, uma tempestade e outros estímulos que misturam o deslumbramento com o temor. Uma das teorias mais aceitas para explicar essa experiência é o encolhimento do ego, quando passamos a nos sentir um grão de areia frente a algo sublime. Pesquisas demonstram que o awe é capaz de incrementar as emoções positivas e o estado de humor, deixa as pessoas com atitudes pró-sociais, condições valiosas para o bem estar psíquico.
Outras vivências frequentemente associadas ao awe são os ritos religiosos e não religiosos, drogas psicodélicas e a arte. Ah, a Nona Sinfonia de Beethoven é um awe só.
*Dr. Ricardo Teixeira é doutor em neurologia pela Unicamp e diretor do Instituto do Cérebro de Brasília

O tempo de exposição ao estrogênio pode ser estimado em uma mulher antes da menopausa pelo tempo entre a primeira menstruação e a menopausa adicionado ao tempo em que usou estrogênio como anticoncepcional. Uma pergunta muito comum no consultório neurológico é se o tempo prolongado do uso de anticoncepcionais pode aumentar o risco de derrame cerebral e uma grande pesquisa publicada recentemente no periódico Neurology da Academia Americana de Neurologia aponta que maior exposição de estrogênio antes da menopausa, na verdade, reduz esse risco.
O estudo envolveu mais de 120 mil mulheres já na menopausa com acompanhamento por nove anos em média. Tanto o tempo de fertilidade, da primeira menstruação à menopausa, como o tempo de uso de estrogênio como pílula anticoncepcional, conferiram proteção contra a ocorrência de derrame cerebral.
Pesquisas anteriores já haviam demonstrado que o estrogênio tem um certo grau de proteção vascular no coração e no cérebro por suas propriedades vasodilatadoras, antioxidantes e de regulação no metabolismo do colesterol e glicose. Quando se pensa em reposição de estrogênio após a menopausa, essa proteção ocorre com o uso até os 60 anos de idade ou dentro de um período de dez anos após a menopausa. Após esse tempo, a resposta é indiferente ou o risco pode até aumentar.

Uma pesquisa recém-publicada pelo periódico Frontiers in Psychology mostrou que a educação musical entre os adolescentes promove o bem estar mental com maiores indicadores de domínios positivos no desenvolvimento dos jovens como competência e autoconfiança, atributos que estão associados a maiores contribuições para a sociedade e menor chance de comportamentos de risco, mesmo em idades mais avançadas. Aqueles adolescentes em que a educação musical teve início antes dos oito anos de idade se mostraram mais esperançosos com o futuro. O estudo foi conduzido pela Universidade do Sul da California nos EUA e envolveu 120 voluntários.
Uma série de estudos já havia demonstrado resultados positivos da educação musical sobre o desempenho acadêmico de crianças, com maior desempenho cognitivo, incluindo criatividade, mais autoconfiança e estabilidade emocional e aumento da conexão com a escola e a comunidade. Na pesquisa inicialmente destacada, os efeitos positivos foram demonstrados mesmo entre aqueles que tiveram a educação musical através de curso online para estudantes do ensino médio desenvolvido pela Fundação Fender em 2020, ápice da pandemia por coronavirus. O curso tem duração de três meses, uma hora duas vezes por semana. Aqueles que se inscrevem têm os instrumentos musicais emprestados pela Fundação Fender.
Fica aí a dica para os produtores de instrumentos musicais e aos gestores de educação no Brasil. Termino com o fim da carta às próximas gerações de artistas escrita por Herbie Hancock e Wayne Shorter para acender as mentes criativas. Acho que isso deveria servir de inspiração a todos nós, independente de sermos ou não artistas. A vida pode ser uma obra de arte. Aliás, deve ser.
“Tudo o que existe é produto da imaginação de alguém; cuide bem e nutra sua imaginação e você sempre se encontrará à beira da descoberta. Como cada um desses fatores levam à criação de uma sociedade pacífica? – você deve estar se perguntando. Tudo começa com uma causa. Suas causas criam os efeitos que moldam o seu futuro e o futuro de todos ao seu redor. Sejam os protagonistas no filme de suas vidas. Vocês são os diretores, os produtores e os atores. Sejam ousados e incansavelmente benevolentes enquanto dançam pela viagem que é esta vida”.

A culpa de ter feito algo de que nos arrependemos é um sentimento bem desconfortável, especialmente quando ficamos ruminando essa culpa por longos períodos. Um estudo liderado por pesquisadores da Universidade de Basel na Suíça, e recém-publicado pela prestigiada Scientific Reports, mostra que o placebo pode reduzir esse sentimento, mesmo que você saiba que está tomando uma pílula de farinha.
Os voluntários da pesquisa eram instruídos a escrever uma situação em que se sentiam arrependidos como uma conduta fora das regras sociais ou um tratamento injusto com outra pessoa. Tomavam então uma pílula placebo, sendo avisados ou não que era placebo. Um grupo controle não tomava nada e ficava folheando uma revista de paisagens. Logo depois eles eram orientados a pensar de olhos fechados por um minuto na situação que tinham escrito e então o sentimento de culpa era quantificado. Aqueles que tomaram placebo, sabendo ou não, apresentaram menor sentimento de culpa.
Os participantes da pesquisa não apresentavam qualquer transtorno mental e novos estudos deverão ser realizados em pacientes com doenças psiquiátricas, especialmente a depressão, condição onde o sentimento de culpa é muito prevalente.
Não é a primeira vez que temos evidências de que o placebo funciona mesmo quando o indivíduo sabe que o que está sendo administrado é placebo. Esse fenômeno já foi demonstrado no controle da ansiedade e dor, por exemplo, mas também em quadros de rinite, enxaqueca e síndrome do intestino irritável. É muito importante que o terapeuta instrua os pacientes que o placebo pode ter efeitos significativos e que devem ter um pensamento positivo para potencializar seu efeito. E mais: passar a mensagem de que o placebo funcionará mesmo sem esse pensamento positivo.
Um estudo publicado no ano de 2001 pela revista Science deu uma balançada naquilo que a comunidade científica até então entendia como efeito placebo. Pacientes portadores da Doença de Parkinson receberam medicação específica para a doença (levodopa) ou pílulas placebo e o surpreendente foi que tanto os pacientes que receberam a medicação como aqueles que receberam placebo, e que tiveram boa resposta clínica, demonstraram aumento das concentrações de dopamina no cérebro.
Em outro estudo mais recente, publicado pela revista Neurology, pesquisadores de Luxemburgo mostraram que pacientes com a Doença de Parkinson que tinham boa resposta ao placebo apresentavam aumento de dopamina no cérebro em regiões que são comuns ao efeito cerebral de recompensa. Isso sugere que o fator “expectativa positiva” pode ter um importante papel no efeito placebo.
Em quadros de dor, também há evidências de que o placebo muda quimicamente o cérebro, dessa vez através da liberação de opioides endógenos, efeito que pode ser desfeito através de medicações que bloqueiam o efeito de medicações opioides. As mudanças químicas também ocorrem em quadros depressivos, sendo que o placebo apresenta efeito muito semelhante às drogas que aumentam a concentração de serotonina (ex: fluoxetina). Nessas duas condições, a “expectativa positiva” também parece ser a forma como o cérebro faz com que o efeito placebo funcione. E essa parece ser a explicação do porquê de algumas pessoas responderem positivamente ao placebo e outras não. Há evidências de que bons respondedores apresentam expectativa de receber maiores recompensas e têm maior ativação do sistema de recompensa cerebral, não só na situação de tratamento, mas também em situações de jogos que envolvem recompensa em dinheiro.
Em 2016, o British Medical Journal publicou uma pesquisa revelando que a maioria dos americanos não vê problema em receber uma medicação placebo. O estudo envolveu 853 voluntários com idades entre 18 e 75 anos que eram acompanhados por alguma condição clínica crônica. Apenas 22% achavam inaceitável o uso de placebo. O restante considerava o placebo uma alternativa possível nos casos em que o médico tem clareza que os benefícios são maiores que os riscos e, melhor ainda, quando existir transparência no que está sendo proposto quando o médico é interrogado.

Por Prof. Dr. Ricardo Teixeira
Todas as pessoas que nos maltrataram durante anos merecem pagar, mesmo que estejam mortas – o inferno pode esperar. (Chico Science)
No dia 10 de janeiro, o jornal Estado de São Paulo divulgou estudo que apontou que 18.4% dos brasileiros entrevistados concordam com a depredação dos prédios públicos. Mostrou ainda que 38% acreditam que os atos golpistas se justificam de alguma forma. No dia seguinte, pesquisa Datafolha mostra que 3% dos entrevistas são a favor dos ataques.
O judiciário promete responsabilização e punição dos organizadores, financiadores e manifestantes do ato golpista. Inclui também nessa lista os incentivadores. A presidente interina do Conselho Federal de Medicina pode ser incluída nessa última categoria, ao comemorar nas redes sociais o ato terrorista com comentário de “agora vai!”? Jair Messias deveria ser incluído só nessa categoria ou também na categoria de idealizadores?
James Piazza da Universidade da Pensilvânia nos EUA nos ajuda a responder essa questão. Ele publicou uma pesquisa em 2020 no periódico International Interactions mostrando que discursos de ódio efetuados por políticos alimentam a polarização política que por sua vez aumenta o terrorismo doméstico. A pesquisa analisou o teor de ódio em discursos políticos e a incidência de atos terroristas em 163 países no período entre 2000 e 2017.
Existe um consenso de que há um espectro de visões políticas extremistas e outro de ações extremistas. O radicalismo nesse espectro de opiniões não chega a se manifestar em radicalismo de ações, como atentados terroristas, em 99% dos casos.
Há um perfil psicológico comum entre indivíduos que passam do extremismo de ideias para ações terroristas? Décadas de pesquisas têm nos mostrado que não existe um perfil psicológico para um terrorista. Não existe um transtorno mental específico que é associado ao terrorismo. Entretanto, alguns terroristas apresentam alguns traços psicológicos mais comuns que a população geral e, mesmo nesse grupo, a prevalência de transtornos mentais não chega a 50%. Chamar os perpetradores do ato terrorista de doentes mentais alimenta o estigma de quem realmente sofre com as doenças mentais.
A ideia de que o terrorista seja absolutamente racional para alcançar seus objetivos é bastante aceita. Porém, pesquisas têm demonstrado que eles são influenciados sim pelas emoções, como a raiva, assumindo comportamentos míopes, frequentemente cegos. Podemos pensar neles como buchas de canhão, com personalidade coletiva que seguem um grande influencer.
*Dr. Ricardo Teixeira é doutor em neurologia pela Unicamp e diretor clínico do Instituto do Cérebro de Brasília

Há poucos dias o periódico Nature Communications publicou a análise de uma grande amostragem de mais de 700 mil indivíduos em 68 diferentes países em cinco continentes mostrando que as pessoas têm dormido em média sete horas por noite. Países próximos ao Equador dormem um pouco menos e o Brasil ficou bem próximo à média.
Além da enorme abrangência do estudo, o ineditismo dos resultados incluiu a demonstração de três momentos diferentes na idade adulta e diferentes durações do sono, independente do país e nível educacional. Os indivíduos estudados eram maiores de 18 anos e até os 33 anos foi o período em que dormiam mais. A partir dessa idade houve um platô de estabilidade até os 53 anos, após o que os voluntários voltavam a ter incrementos no tempo de sono.
Você acha que seus ancestrais dormiam mais que você?
É bastante tentador imaginar que o mundo contemporâneo, com toda sua eletricidade, aparelhos eletrônicos e cafeína além da conta, tem o hábito de dormir menos que nossos ancestrais. Isso sem falar nos atuais índices de depressão, ansiedade e obesidade que costumam atrapalhar o sono. Podemos encontrar relatos já no fim do século XIX de que as pessoas estavam dormindo menos que os antigos, mas parece que a história é um pouco diferente.
Uma pesquisa publicada no prestigiado periódico Current Biology mostrou que caçadores-coletores de três diferentes partes do mundo dormem até um pouco menos do que os homens de vida moderna. O registro da rotina de sono de comunidades de caçadores-coletores na Namíbia, Tanzania e Bolívia que vivem sem luz elétrica apontou que eles dormem em média 6.5 horas, menos que a média das sociedades atuais que é de aproximadamente 7 horas.
A pesquisa ainda demonstrou que essas comunidades unplugged não tiram cochilos durante o dia, deitam-se para dormir cerca de três horas após o pôr do sol e acordam antes do sol nascer. Eles também dormem uma hora a menos no verão. Apesar de terem genéticas e viverem em ambientes bem diferentes, os hábitos de sono não foram diferentes entre as comunidades. O padrão de sono descrito na Europa antiga dividido em dois tempos separados por um intervalo em vigília não foi identificado nas comunidades estudadas, sugerindo que esse sono não interrompido deva ser o padrão natural dos nossos ancestrais mais antigos, e que o sono europeu repartido já foi uma adaptação às condições ambientais do continente.
Chamou muita a atenção a quase inexistência de insônia, o que nos faz interrogar se a simulação desses ambientes arcaicos não poderia ser eficaz no tratamento da insônia dos homens de vida moderna.

E não é que o som ambiente pode mudar o sabor da sua ceia? Se a ceia tiver muitas comidinhas doces ou azedas, ela ficará mais saborosa se a música tiver tons mais agudos. A torta de limão terá mais presença ao som de violinos de Vivaldi. Se na ceia predominar gostos amargos ou unamis**, música com tons graves realçará os sabores. O café, sem dúvida, será muito bem acompanhado por uma ária com Plácido Domingo. Essa influência de uma experiência sensorial sobre outra é uma interessante linha de pesquisa da Universidade de Oxford na Inglaterra liderada pelo psicólogo Charles Spence.
O laboratório de Spence testou também diferentes músicas para diferentes vinhos. O mesmo vinho é considerado mais encorpado ao som de Carmina Burana de Carl Orff quando comparado a Mozart. Há um certo consenso que os tintos não gostam de música alegre. Os brancos adoram Mozart.
Spence tem levado suas experiências para o mundo real. Ele criou uma playlist para a British Airways direcionada ao cardápio dos voos e dá seus pitacos em restaurantes sofisticados. Defende também a ideia de que uma pasta fica mais autêntica se tiver uma música italiana ao fundo, cítaras para comida indiana, e por aí vai.
** unami é reconhecido como um quinto tipo de sabor, lado a lado com doce, azedo, amargo e ácido. Unami é uma palavra de origem japonesa e significa delicioso, saboroso. Alimentos ricos em glutamato como as algas marinhas, cogumelos shitaki e crustáceos são exemplos do sabor unami. Na verdade, o sabor nem é tão divino, mas ele torna agradável a palatabilidade de um grande número de alimentos. É a delícia do queijo parmesão por cima do molho bolonhesa.

Por Dr. Ricardo Teixeira
Renato Aragão recebeu alta hospitalar nesta terça-feira após internação por um acidente isquêmico transitório (AIT) e, já em casa, com bom humor, se manifestou nas redes sociais dizendo que Didi está on. O AIT ocorre quando uma artéria cerebral é obstruída e os sintomas duram menos de 24 horas. Em cerca de 1/3 dos pacientes os sintomas duram menos de uma hora, em outro terço até 12 horas e o restante entre 12 e 24 horas. O correto diagnóstico é imprescindível, já que em 3 meses 10% irão apresentar um acidente vascular cerebral (AVC), sendo que metade deles ocorrerão nas primeiras 48 horas.
Trataremos em seguida o AIT e o AVC pelo termo Doença Cerebrovascular (DCV).
Na luta contra a DCV, seu papel é muito maior do que você imagina!
A DCV é mais comum entre as entre as pessoas que têm hipertensão arterial, diabetes, colesterol alto, doenças do coração e naqueles sedentários, que fumam e usam muito álcool. Calcula-se que o indivíduo que identifica e trata um desses fatores de risco reduz seu risco de DCV pela metade. Mais importante ainda é o fato que esse mesmo indivíduo que adota hábitos de vida saudáveis é capaz de influenciar as pessoas ao seu redor a assumirem também esses bons hábitos. Saúde é mesmo contagiante!
Como identificar um AIT ou AVC?
Toda vez que ocorrer algum destes sintomas, de forma REPENTINA:
- Fraqueza de um lado do corpo
- Dormência de um lado do corpo
- Dificuldade visual
- Dificuldade para falar
- Dor de cabeça muito forte nunca antes sentida
- Incapacidade de se manter em pé
O que fazer diante de um sintoma suspeito?
Procurar imediatamente um serviço médico especializado, pois o tratamento na maioria das vezes só tem efeito se realizado nas primeiras horas após o início dos sintomas.
O tratamento precoce aumenta a chance de preservar a parte do cérebro que está para ser destruída, diminuindo assim as sequelas tão temidas como paralisia e perda da fala, assim como o risco de morte.
O que fazer para evitar a DCV?
- Prática de exercícios regulares;
- Alimentação balanceada evitando o consumo excessivo de alimentos de origem animal (ex. carnes, ovos, leites e derivados);
- Não fumar;
- Evitar o excesso de álcool e o estresse;
- Se tiver mais de 40 anos: realizar pelo menos uma vez por ano controle de pressão arterial, dosagem de glicose e colesterol no sangue;
- Se tiver diagnóstico de hipertensão arterial, diabetes, colesterol alto ou qualquer doença do coração: acompanhamento médico frequente para controle rígido destas condições.

Uma análise dos principais estudos sobre o efeito da maconha sobre o cérebro dos adolescentes confirma que seu uso pode realmente reduzir a capacidade cognitiva nessa população. O estudo envolveu 808 adolescentes que usavam a droga pelo menos uma vez por semana por pelo menos seis meses. Após acompanhamento até os 18 anos de idade, sendo que em um dos estudos até os 38 anos, os resultados mostraram que o consumo da maconha reduziu em dois pontos o Quociente de Inteligência, especialmente por redução da memória verbal.
E não é só isso. Atendo no consultório recorrentemente adolescentes com transtornos psiquiátricos associados ao consumo da maconha. Usuários de maconha têm chance 40% maior de apresentar sintomas psicóticos no decorrer da vida, e um risco mais duas vezes maior de desenvolver esquizofrenia entre aqueles que usaram a droga antes dos 18 anos de idade. E aquilo que já foi um tema controverso, há algum tempo não é mais motivo de discussão: o uso regular de maconha aumenta sim o risco do uso de outras drogas ilícitas como a cocaína. Adolescentes com uso esporádico ou frequente têm um risco 26 vezes maior de usarem outras drogas ilícitas, 37 vezes maior de se tornarem tabagistas e três vezes maior de consumirem álcool em quantidades exageradas. Quanto mais precoce for o uso crônico da maconha, maiores os danos. O aumento do consumo de álcool foi demonstrado recentemente numa análise de mais de 4 milhões de adultos americanos em 11 estados em que houve a liberação do consumo recreativo da maconha, especialmente entre aqueles com idades entre 18 e 24 anos.
As evidências científicas dessa história não são nem um pouco tímidas. Uma prova incontestável de que o cérebro adolescente é realmente mais sensível aos efeitos tóxicos da maconha é o estudo publicado pela revista Brain em 2012 em que foram demonstradas alterações microestruturais que reduzem a eficiência das conexões cerebrais entre usuários crônicos de maconha. Mais uma vez, as perdas foram maiores naqueles que começaram a fumar já no início da adolescência.
Existe uma crescente ideia entre os jovens de que o cigarro é “careta”, pois faz mal à saúde, e de que a maconha é bem diferente. O conjunto de evidências que dispomos atualmente demonstra que tanto o cigarro como o álcool trazem muito mais danos à sociedade do que a maconha, mas também revelam que os efeitos negativos da maconha sobre a saúde humana não são nada desprezíveis. Para entender ainda mais os efeitos da maconha sobre o cérebro dos adolescentes, um grande estudo está em andamento nos EUA e acompanhará dez mil crianças a partir dos dez anos de idade (Adolescent Brain Cognitive Development Study). Esse estudo nos trará resultados sobre o efeito da maconha em um cérebro em desenvolvimento, reunindo análises genéticas, neuropsicológicas, de neuroimagem e rendimento acadêmico.

O reconhecimento de odores específicos exalados por pessoas que sofrem de uma determinada doença é descrito desde a época de Hipócrates na Grécia antiga. Eu mesmo tive a sorte e a honra de ter sido aluno na graduação em medicina na UNB do incrível Sir Philip Davis Marsden e, na beira do leito, ele me pedia para cheirar os pacientes e dar minha impressão. E o Sir aqui é Sir mesmo: Cavaleiro de sua Majestade, honraria concedida pela Rainha da Inglaterra pelo conjunto de sua obra. Condições clínicas como diabetes descompensado, insuficiência renal ou hepática não eram difíceis de serem identificados pelo cheiro, mas muitos diagnósticos, especialmente os infecciosos, só mesmo o Sir Philip Marsden e, muito provavelmente, os cães. Cães?
Cães treinados para identificação de odores exalados por indivíduos nas fases precoces de doenças têm mostrado resultados positivos em alguns tipos de câncer. O exame de sangue oculto nas fezes é capaz de detectar câncer colorretal em 44% dos pacientes, mas os cães o detectam pelo cheiro da respiração do paciente em 91% dos casos. Componentes voláteis numa série de doenças têm sido isolados e, no futuro, “narizes eletrônicos” poderão fazer parte dos check-ups médicos. O interessante é que esses narizes eletrônicos não chegaram perto ainda da sensibilidade do olfato canino. Enquanto a tecnologia só funciona com uma concentração mínima de componentes voláteis da ordem de 100 a 400, os cães só precisam de 0.001.
E os cães não param de marcar golaços. Recentemente, a revista Scientific Reports publicou os resultados de uma pesquisa que mostrou que cães treinados a sentir o odor de pacientes portadores de epilepsia são capazes de identificar o cheiro de crise em outros portadores de epilepsia totalmente novos para os cães. E essa capacidade de identificação foi demostrada em nada mais, nada menos, que em 100 % dos cães envolvidos no estudo. Dentre os estudos de identificação de doenças por cães, esse foi o que teve resultados mais espetaculares.
A pesquisa não foi feita para demonstrar antecipação de crises, mas menores já demonstraram essa capacidade dos cães, não só em crises epilépticas, como também na enxaqueca. O fato é que os resultados deixam claro que existe sim um odor característico associado a crises epilépticas e novos estudos serão feitos para identificar que componente é esse e se os cães são capazes de percebê-los antes das crises se instalarem.
Há poucos meses foi demonstrado que os cães são capazes de identificar o estresse vivido por voluntários ao resolver problemas aritméticos! Aqueles que relataram desconforto durante a atividade e alterações na frequência cardíaca e respiratória foram facilmente identificados pelos cães em 94% das vezes. Eles conseguiam separar com esse nível de acerto amostras de suor e da respiração após a situação de estresse e em momentos de relaxamento no mesmo indivíduo. Isso pode ter aplicação prática no treinamento de cães para o tratamento de indivíduos com ansiedade e estresse pós-traumático, por exemplo.

Poucas coisas no mundo têm o alcance global de uma Copa do Mundo Fifa. Mesmo com todas as críticas relacionadas aos direitos humanos dos trabalhadores na construção dos estádios e o número alarmante de mortes, ontem, no primeiro jogo da Copa do Catar, a lotação do estádio ultrapassou sua capacidade em mais de sete mil pessoas. Elenco aqui alguns candidatos que podem explicar o sucesso estrondoso desse esporte.
1-Futebol é coisa muito mais antiga que os ingleses.
Os ingleses colocaram ordem na casa em 1863, botando no papel as regras, especialmente para diferenciar o futebol de outros esportes parecidos como o Rugby. Nessa época, cerca de um quarto do mundo pertencia à Coroa Britânica e é claro que ela foi a garota propaganda perfeita para exportar o esporte para os quatro cantos do mundo.
Entretanto, temos evidências de que algo muito parecido já acontecia na China nos 3000 a.C. Com traves de 10m de altura, esse futebol arcaico também era usado como treinamento militar. A obra mais antiga da civilização Maia, o Popol Vuh, depois de falar que no início era só água e o céu, logo em seguida a terra e as montanhas, depois vieram os animais, os homens… e a “pelota” já estava lá. Chutar é algo muito instintivo e acredita-se que a coisa pode ter começado ainda na idade da pedra.
2- A simplicidade do futebol facilita muito.
Fácil para qualquer um assistir e entender as regras, fácil de disseminar, fácil de angariar novos adeptos. É um esporte de inclusão, não precisa ser rico, na grama ou na terra.
3- Improvisação e presença de espírito são ingredientes que fazem o futebol ser mais atraente que tantos outros esportes.
Balãozinho, meia lua, bicicleta, e como diz o velho ditado, a vida é como o futebol: cada lance é diferente do outro. Carrinho, canelada, trombadas, gol roubado, evocam nossos sentimentos de raiva e, quando acompanhados de milhares de companheiros torcedores do mesmo time, pode ter efeitos bem amplificados.
4- Publicidade hoje ajuda muito, mas ela é só uma das peças de um círculo virtuoso.
É mais atraente e popular e por isso recebe mais investimentos publicitários que aumentam ainda mais a popularidade.
5- A atmosfera das torcidas dá todo o tempero.
Se você já torceu por seu time do coração em um estádio lotado, não preciso nem falar nada. A experiência de sentir um pertencimento a algo maior faz com que nosso cérebro vibre em outra frequência. Viver a mesma emoção de forma sincrônica com 50 mil pessoas é algo sobrenatural!