Uma pesquisa publicada esta semana em um dos periódicos da Associação Americana de Medicina – Archives of Internal Medicine – aponta que os médicos nem sempre escolhem para si mesmos aquilo que recomendam a seus pacientes.

 

Cerca de mil médicos americanos responderam um questionário que avaliava duas situações médicas em que eles tinham que escolher entre duas opções de tratamento. Metade dos médicos era instruída a fazer a opção para um paciente hipotético enquanto a outra metade deveria responder de forma pessoal, ou seja, o que o médico escolheria se fosse o paciente.

 

As escolhas feitas para os pacientes e para os médicos-pacientes foram bem diferentes. Os médicos tiveram a tendência em escolher para os pacientes tratamentos com maior poder de prolongar a vida, mesmo que associados a um maior contingente de efeitos adversos.

 

Uma das situações clínicas era a escolha do tipo de cirurgia para um câncer colorretal. Ambas as opções ofereciam uma chance de cura de 80%. Quando a indicação era para eles mesmos, 38% dos médicos optaram pela cirurgia com maior risco de mortalidade, porém com menos efeitos adversos, como diarréia, uso de bolsa de colostomia, constipação intestinal e infecção na ferida operatória. Por outro lado, quando a cirurgia era para o paciente, apenas 24.5% dos médicos escolheram esta opção.

 

O segundo cenário era de infecção por gripe aviária. Se uma determinada medicação não fosse usada, a chance de morte seria de 10% e de hospitalização seria de 30%.  Por outro lado, o tratamento reduzia esses índices pela metade, mas a própria medicação provocava morte e paralisia permanente em 1% e 3% dos casos respectivamente.  Na hora de escolher, 48.5% dos médicos evitariam o tratamento para os pacientes e, quando o tratamento era para eles mesmos, 63% optaram por não usar a medicação, o que traria um maior risco de morte.

 

Não podemos generalizar com base nesses resultados que os médicos façam piores escolhas para eles mesmos do que para os pacientes. Na verdade o médico pensa diferente quando toma uma decisão para si mesmo, com maior componente emocional e menos censura, já que ele não deve explicações da sua decisão aos outros, pelo menos do ponto de vista profissional.

 

A pesquisa levanta uma questão muito importante no que diz respeito à prática médica: o médico deve recomendar ao seu paciente aquilo que ele faria para si mesmo ou deve apenas colocar as cartas na mesa, expondo as vantagens e desvantagens de cada tratamento para que o paciente faça a sua escolha? Experts no assunto têm opiniões divididas.

 

Atualmente, mesmo com a internet e a medicina mercantilista dando outras caras à relação médico-paciente, é inequívoco que os pacientes ainda valorizam muito a opinião do médico. Essa opinião pode até atrapalhar em algumas circunstâncias, mas acredito que na maioria das vezes ela pode enriquecer o processo de decisão, juntando-se aos dados objetivos de prós e contras de cada opção e à apreciação do próprio paciente. Muitas vezes a análise também é influenciada pelos pitacos ora certeiros, ora desastrosos do Dr. Google.

 

 

 

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